Mangualde, o 19 de Março e o antigo Colégio de José e Sta. Maria…

O 19 de Março foi em tempos dia de aniversário e de festa no Colégio de S. José e Sta Maria em Mangualde.

Nesta data, uma suave melancolia bate à porta de todos quantos por lá passaram, como alunos e professores.

Feitas as rigorosas 4ª classe e admissão, entrei no Colégio.

Recordo o primeiro dia, tímido de tão aldeão, olhar de espanto posto na beleza singela e elegante, jamais esquecida, da sua fachada principal, e bebendo ávido de curiosidade aquele mundo novo, onde chegava por sete anos.

Depois, os anos foram correndo de sala em sala de aulas.

Nestas, nas aulas, imperava a profunda seriedade e o imenso profissionalismo do ensino de então; o saber, a competência no leccionar e o empenhamento sem limites dos docentes, a disciplina e a exigência na aprendizagem e na avaliação, eram uma constante da excelência do ensino ali ministrado, traduzido em níveis de sucesso escolar elevadíssimos e, no prestígio indiscutível do Colégio, projectado além distrito de Viseu, por todo o Portugal e até no antigo Ultramar.

Em torrente ocorrem-me memórias de colegas, professores, situações e momentos, que marcaram o imaginário desse meu tempo adolescente e estudante.

Recordo, em particular, a figura solene e inesquecível da Dona Felismina, a autoridade e a força do Dr. José Alcântara, o sereno e distinto Dr. João Serrano, a simpatia amiga e a eficiência do Dr. Mendes, o profissionalismo excepcional do Dr. Castanheira e Esposa, o Dr. Sérgio e a sua pedagogia inovadora, a competência e a personalidade forte da D. Arminda Alcântara e a severidade exigente da D. Luísa Abrantes…

… foram estes os meus professores a quem, fora de tempo embora e, na memória deste evento, presto a humilde homenagem dum simples bem hajam, por tudo quanto me ensinaram e, pela companhia que me fizeram ao longo da vida, na mente e no coração, através do saber particular, que em cada um aprendi.

De quando em quando, perdem-se-me os passos pelos caminhos do Colégio e, ali me quedo por breves momentos, deixando correr o olhar pelo passado, através e para além dos edifícios.

Os ecos da saudade teimosa daqueles tempos, trazem-me de novo sons de campainha tocando intervalos e imagens de corredores, átrio e recreios explodindo em correrias, jogos e bulícios ruidosos de adolescências exuberantes de vida, alegria e sonhos de futuro, então ali vividos e garantidos na honestidade do ensino e do estudo.

Lateralmente, pequenos nadas, feitos de irreverências inocentes, que são parte desta nostalgia, vêm-me à ideia nas figuras saudosas dalguns colegas e também, das frequentadíssimas “tascas” da “Ti Vasquinha”, e do “Ti Nuno” mais a sua inseparável “Escapelinha”, bichana mimada, alvo preferencial das tropelias da estudantada, em particular, do meu amigo Caldas, especialista na arte de irritar o pacífico felino e, quando tal, de imediato era corrido porta fora, no voltear ameaçador dum metro de pau, por ele dito de “noventa centímetros”, referência sistemática esta, que ainda mais enfurecia o “Ti Nuno”.

Ali se compravam, clandestinos e avulso, os primeiros cigarritos, “Definitivos” ou “Provisórios”, fumados depois na estratégica “Esquina”, em pose treinada de homens feitos, botando fumo em argolas, olho matreiro posto nas meninas que passavam e, na espreita do Dr. Zeca, cuja surpresa na chegada, trazia ralhete certo, se não mesmo expedita, pesada e certeira palmada correctiva.

A democracia trouxe mudanças inevitáveis para a Educação; esta massificou-se, proletarizou-se mas, felizmente, é ainda o Colégio um espaço, embora anónimo, do novo sistema educativo, já sem o antigo carácter privado; oficializado e perdido na turba multa de tanta nova escola, foi-se-lhe o charme e o encanto de outrora.

Olhando as suas já velhas pedras, vestidas de musgos e limos do seu longo e excepcional serviço prestado ao ensino, sinto-lhes lágrimas escorrendo tristes, vertidas da tal “saudade teimosa” dum tempo, que no tempo para sempre se foi.

Obra notável duma ilustre Família, prestou o Colégio de S. José e Sta. Maria um inestimável serviço à Educação, à Cultura, ao Desenvolvimento e ao Progresso, não só no concelho de Mangualde mas, por todo esse País, de onde vieram e por onde se espalharam, todos os que ali estudaram e, como tal, é e será para sempre o Colégio credor da mais subida estima, respeito e admiração, não só dos seus alunos, mas também das gentes desta terra beirã.

Quanto ao seu “aniversário”, o 19 de Março e dia de S. José, já não tem festa, nem bolo, nem velas mas, desperta ainda “festa, bolos e velas”, nas memórias e nos corações de todos quantos tiveram a sorte de o conhecer e viver.

José Luiz da Costa Sousa 
Aluno do Colégio de 1958 a 1965