A palavra MANGUALDE é puramente Germânica; a  origem  deste termo reporta-se aos tempos do domínio pós-romano, quando os povos bárbaros, Suevos, Godos, Visigodos e outros se estabeleceram nesta parte ocidental da Península.

Uma outra hipótese da origem da palavra Mangualde, considerada no dicionário de Pinho Leal, seria a sua eventual derivação da palavra “mangual”, uma pequena alfaia agrícola para “malhar/extrair” grãos vários das vagens secas dos feijões, ervilhas, cereais e dos carolos do milho, ou talvez de “manqual”, nome dado pelos antigos ao jogo da bola ou do fito, mas ambas devem pôr-se de parte, por não se compatibilizarem com a sua origem etimológica.

A palavra Mangualde aparece como topónimo de três localidades que são, Mangualde de Azurara, Mangualde da Serra, concelho de Gouveia e Mangualde do Minho, concelho de Barcelos, e que deverão ter como origem um similar facto histórico.

A publicação “Os nomes germânicos na toponímia portuguesa”, de Joseph M. Piel, afirma que os Suevos e os Godos, povos germânicos, deram o nome a muitas localidades no norte de Portugal e na Galiza, totalizando cerca de 2.400 nomes, segundo um estudioso germanista de nome Sachs.

Os nomes aplicados pelos Germanos (Godos e Visigodos) a um agregado humano ou localidade eram sempre representativos duma determinada pessoa, ou seja, um patronímico; essa pessoa era sempre o proprietário, por justo título, de toda a propriedade dessa localidade, por norma pequena.

O nome ou topónimo Mangualde teve a sua origem na designação atribuída a um “fundo ou vila agrícola”, que surgiu na parte ocidental de Mangualde, conhecida ainda hoje como “cabo da vila”, e que foi o núcleo inicial e embrionário desta nossa linda cidade.

O termo “Vila” significava à época “uma propriedade rústica, constituída pela habitação do proprietário, as dos trabalhadores, os estábulos e celeiros, terrenos cultos e incultos, tudo integrado numa unidade rural”.

Segundo Leite de Vasconcelos, a palavra MANGUALDE deriva de MANNUALDUS, genitivo MANNUALDIS, que era o nome do proprietário, um visigodo/germânico, da vila ou fundo agrícola atrás referido.

A palavra Mangualde, na sua origem, era composta pela justaposição de dois termos: – MANN, homem, e WALDAN, do alemão governar ou floresta, que eram os dois elementos constitutivos do nome do proprietário do fundo ou vila agrícola em questão, dando MANNAWALDAN (homem que governa ou homem da floresta), com as declinações MANNUALDUS/ MANNUALDIS, que evoluíram para MAOALDI, MANGUALDE.

Houve ao longo do tempo outras evoluções, algumas discutíveis, outras não, tais como:- Manhaldi, Moaldi, Moalde, assumindo a sua forma definitiva de Mangualde nos séculos XVI e XVII.

Ao topónimo Mangualde aparece associado, ao longo da História e ainda hoje, o termo ou termos de Azurara ou Azurara da Beira, significando apenas e só que a localidade de Mangualde era do Concelho de Azurara da Beira.

O termo Azurara reporta-se ao facto/tradição de, no decurso da conquista desta parte da Lusitânia pelos mouros, ocorrida a partir de 711, o Castelo de Mangualde, de origem romana ou visigótica, ter sido por eles conquistado e ocupado, e ter sido o seu último Alcaide um árabe de nome Zurara que, por corrupção popular, evoluiu para Zurão, de onde mais tarde derivou o nome do Concelho de Mangualde, para Azurara da Beira.

Zurara ou Zurão foi, pois, o Alcaide árabe do Castelo de Mangualde e que, até à reconquista cristã do Castelo, representou aqui o poder dos Emires da Península.

Alcaide era todo aquele que governava um castelo, província e/ou comarca com poder civil ou milita.

As lutas da reconquista cristã na Beira, no decurso das quais o Castelo de Mangualde foi tomado aos Mouros, duraram cerca de 60 anos, de acordo com Alexandre Herculano, tendo sido particularmente intensas no reinado de D. Afonso V e do seu sucessor D. Bermudo do Reino de Leão e Castela, no século XI.

Quando mais tarde, D. Fernando Magno, de Leão e Castela, tomou Seia, Lamego, Viseu e Coimbra, o Castelo de Mangualde, ponto crítico da defesa da região, tinha já caído nas mãos dos cristãos.

É muito curiosa e romanceada a lenda da tomada do Castelo de Mangualde aos mouros e ao seu Alcaide Zurão, a qual o Frei Agostinho de Santa Maria, no seu livro “Santuário Mariano”, relata assim: –

“O Castelo foi atacado, ocupado e incendiado, quando o seu Alcaide Zurão se encontrava no Castelo de Linhares, domínio já dum Governador Cristão, para onde Zurão tinha sido convidado traiçoeiramente, e ali morreu de tristeza e dor, observando de Linhares, o incêndio do seu Castelo”

Pondo de parte esta lenda, que efabula uma das mais românticas novelas medievais, próprias de tão conturbados tempos e bárbaros sentimentos, não se pode acreditar na tomada do castelo sem que tenha havido uma renhida e sanguinária luta entre os cristãos e os mouros.

O Concelho de Mangualde, até fins do século XVIII e princípios do XIX, foi em todos os documentos designado por Concelho de Zurara, ou de Azurara da Beira, e só desde então, há quem diga que só com o fim do regímen liberal, é que tal nome desapareceu, e deu lugar a  Concelho de Mangualde, até hoje.

Porque é que se produziu tal alteração?

Esta alteração seria natural, se houvesse uma povoação sede do Concelho de nome Zurara ou Azurara da Beira, e caso tivesse havido transferência da sede de Concelho dessa outra povoação para Mangualde.

Mas o estudo atento da toponímia do Concelho, à face de toda a História do Concelho, diz que nunca existiu nenhuma povoação com o nome de Zurara ou Azurara da Beira; as Inquirições de D. Afonso III, de 1258, referem o Concelho de Zurara, mas nunca uma localidade de Zurara, embora designem a Igreja Matriz de Mangualde, como sendo a Igreja de S. Julião de Zurara.

No 1º censo da população da Beira, ordenado por D. João III em 1527, também não aparece nenhuma povoação com o nome de Zurara; a Corografia Portuguesa do padre António Carvalho da Costa, de 1708, indica todas as povoações do Concelho e não há nenhuma Azurara; o Vigário de Mangualde, José Rebelo de Mesquita, nas notas escritas acerca da Vila de Mangualde, em 1758, arquivadas na Torre do Tombo, diz que o Concelho de Mangualde tem 49 lugares e nenhum deles com o nome Zurara.

A invasão árabe da península inicia-se em 711 e, dois anos depois, domina-a completamente, quando Murça a seguir a Tárique, assume o comando dos exércitos árabes; depois o Emir Jassez dividiu a Península em cinco grandes províncias, ficando a Beira Alta incluída na província de Mareda (Mérida).

As províncias dividiam-se em regiões militares, e estas tinham à frente governadores designados pelo título de Vizires ou Alcaides; o Alcaide de Zurara tinha sob a sua autoridade superior toda a vasta extensão, que corria entre o Mondego e o Dão.

Em documentos do século XVIII arquivados no Município de Mangualde, usavam-se ainda e indiferentemente as expressões Zurara ou Azurara da Beira, ou só Mangualde de Azurara, ou Mangualde de Azurara da Beira.

O nome de Azurara designava não só a vasta região do Concelho de Mangualde, mas, por vezes, aplicava-se também à própria vila.

A expressão Azurara da Beira terá sido posta de parte, porque o desenvolvimento da vila de Mangualde teve tal evolução, que o seu nome se sobrepôs em prestígio ao nome Azurara da Beira, como vila e concelho.

Mangualde nasceu pois no ainda hoje chamado “Cabo da Vila”, sendo então apenas um fundo, vila, ou quinta agrícola, propriedade, como se disse, dum germânico, godo ou visigodo, de nome Mannwaldan, significando este nome de origem germânica, o homem que governa, ou o homem da floresta.

Foi este “Cabo da Vila” o primeiro bairro de Mangualde, designado sempre pela expressão genérica de Vila, termo este cujo razão de ser e significado já se esclareceu; durante toda a Idade Média e mesmo até aos começos do século XVIII, Mangualde estava circunscrito a este pequeno bairro, constituído por humildes e modestas casas, como foram e são ainda muitas das casas lá existentes, que caracterizaram aquela parte da cidade, denominada até hoje por “Cabo da Vila”.

Os Pais do Amaral (Condes de Anadia) residiram também numas modestas moradias neste núcleo inicial de Mangualde, até construírem mais tarde o seu magnífico e opulento Palácio.

A Igreja de S. Julião, construída no século IX/ X, ficava distante e fora do povoado, no caminho velho para Viseu, erma e triste, como eram afinal todos os lugares escolhidos, para as construções religiosas na Idade Média. As outras igrejas são de construção muito mais recente, como a das Almas e a da Misericórdia e o Convento.

Toda a vida social da pequena vila de então se concentrava neste velho e original primeiro Bairro, onde também funcionavam a Câmara Municipal, o Tribunal e a Cadeia, bem como o Pelourinho.

No século XVI, ou princípios de XVII, construiu-se a Torre que, com elegância e aprumo, se ergue à entrada da antiga “Vila/ Cabo da vila”, assente num rochoso granito; serviu esta torre encimada por um campanário, com uma arquitectura medieval, para colocação do relógio da vila, instalado na face da torre voltada a nascente, tendo nela sido finamente esculpidas as horas, num largo mostrador.  Esta torre ainda hoje é conhecida pela Torre do Relógio Velho.

Mais tarde foi adquirido o mecanismo do relógio do Real Mosteiro de Maceira Dão, que foi instalado na torre da Misericórdia, tendo a vila ficado a servir-se apenas deste último.

Com o passar do tempo e o aumento da população, a Vila inicial expandiu-se para um segundo Bairro, o Rossio, área quase desabitada até fins do séc. XVII ou princípios de XVIII.

O termo Rossio significava então lugar ermo e separado da povoação mais próxima, encerrando em si a ideia de cercania duma povoação, subúrbio, baldio ou “terreno rossio”, logradouro público apropriado para jogos, feiras, etc… e que, com o crescimento das povoações, vinha a ficar dentro destas; foi o caso.

O crescimento demográfico de Mangualde obrigou à construção de novas casas para a população em geral, e à aquisição e construção de novas instalações para os serviços públicos, em particular para os Paços do Concelho (1850);  a vila cresceu então para o Rossio onde, consequentemente, se começou a formar um novo segundo Bairro, nos começos do séc. XVIII.

Entretanto foi construída a estrada nacional para a Guarda, que atravessou transversalmente Mangualde em toda a sua extensão, incluindo o Rossio, e logo, mais novas casas se começaram a edificar e a alinhar ao longo desse eixo central, definido pela estrada e Rossio fora.

Nos fins do século XVIII já o “cabo da Vila” e o “Rossio” constituíam um todo único, mas ainda hoje se usam os dois termos, para definir essas duas partes distintas da mesma cidade, mas integradas numa unidade urbana muito bem conseguida, estruturada, organizada, modernizada, ajardinada, dotada de todos os equipamentos e facilidades próprias das mais avançadas cidades do País, proporcionalmente à sua dimensão demográfica.

Depois da aquisição do edifício dos Paços do Concelho em 1850, foi no novo Bairro, e no início do então Rossio, hoje centro da Cidade, que veio a concentrar-se toda a vida social, comercial, oficial e pública da Vila, hoje Cidade, e onde se foram instalando todas as Repartições e Instituições Públicas, Bancos, a maioria dos estabelecimentos comerciais, etc…

Depois, seguiu-se ao longo dos tempos, e continua actualmente, um desenvolvimento geral extraordinário e muito diversificado, mas sempre sólido, dinâmico, rico e constante, que transformou uma vila rural e comercial por excelência, na Cidade de hoje, vibrante de vida económica, industrial, comercial, agrícola, social, cultural, caminhando a passos largos, determinados e seguros,  em direcção a futuros cada vez melhores e mais promissores, para todos os seus munícipes,  já hoje vivendo óptimos presentes.

José Luís da Costa Sousa

Um Mangualdense

Bibliografia: – Publicação “ Concelho de Mangualde” de Valentim da Silva